Priscilla Paula Pessoa uma das selecionadas para o Salão de Artes de Mato Grosso do Sul tem dois motivos para comemorar. Um deles é a premiação dentro do Salão de Artes do MS 2012. O outro, muito mais aguardado, é a chegada do primogênito Raul que nasceu um dia depois desta entrevista! Artista plástica e professora mestra do curso de Artes Visuais da UFMS, considerada no meio discente uma das divas da Universidade, falou sobre carreira artística, acadêmia, portfólios, exposições, arte-contemporânea, produção de obras-de-arte dentro do estado e trabalhar com arte.
De onde veio a vocação para uma carreira artística e a decisão como profissão?
Ter feito
curso de artes visuais foi fundamental para entender a Arte como
profissão. Quando resolvi fazer o curso era para ser um complemento
para minha formação. Fiz ao mesmo tempo faculdade de Direito e
Artes Visuais, minha ideia era ter uma profissão na área de Direito
ou advogar focando em algum concurso. Artes eu já era apaixonada
porém não conseguia ver arte e profissão em conjunto. Tinha uma
visão muito de artista vendendo seu trabalho numa feira da 15 de
novembro. A figura do retratista. Uma coisa dificil de se ganhar
dinheiro. Cursei as duas faculdades em paralelo fazendo as matérias
que gostava mais: História da Arte e Desenho, tanto que no primeiro
ano não fiz todas as matérias. No entanto percebi que o Direito
não tinha nada a ver comigo. Seria uma pessoa absurdamente frustada
e infeliz enquanto Artes, apesar de não ser uma carreira fácil,
detinha muitas possibilidades. Não era tão filosófico quanto
pensava. Terminei os dois optando por trabalhar com artes. Formei em
bacharel querendo ser Artista: trabalhar só para produção mas por
muitos anos desenvolvi coisas paralelas. No meu caso ficava quase
como Mr. Jack e Mr. Hide: um tem que sustentar o outro.
Me formei
em 99 com minha primeira exposição neste mesmo ano, um pouco antes
da formatura. O que foi bem legal por que foi uma tomada de
consciência do que era uma exposição, do que é colocar o seu
trabalho a mostra, seus erros e acertos. E a partir daquele ano me
prôpus a fazer uma produção de arte por ano, ou pelo menos de dois
em dois anos, na maioria das vezes de tendência mais contemporânea.
Sem compromisso comercial. Essa é a carreira que considero como
artista contemporânea. São obras que exponho, mando para salões,
concursos e programas.
Em
paralelo fiz várias coisas: trabalhos em parceria com um
arquiteto-decorador, encomendas, ilustração, etc. Trabalhos que fui
eliminando a medida que eu consegui conciliar a carreira de
professora com a de artista. Hoje sou uma professora e artista.
Se
descobrir como artista e conseguir sobreviver de arte/mercado?
Acho que
tudo é produção artística. Cada vez mais deixo de ver barreiras
que já vi entre as duas coisas. A única separação que fazia era
que tinha uma produção comercial por demanda e outra livre voltada
para o circuito de artes indenpendente de ser vendida ou não. Às
vezes era, às vezes não. As encomendas eram livros que ilustrava,
trabalhava em parceria alguns arquitetos. Já participei de CASACOR,
fiz pintura de parede em muita casa. Muita coisa por que a profissão
de artista tem essa peculiaridade: não é um emprego. Pelo menos, no
começo, é dificil algum artista que não tem que ter algum subsidio
paralelo. Logo que sai da faculdade tive ajuda da minha mãe com um
espaço. Ela me ajudou por que o espaço era dela; pagava só o
condomínio me livrando do aluguel. Dava aulas para crianças e
tinha até um computador, não muito comum na época, que usava pra
ilustração além da minha produção. Por quê é utópico achar
que alguém irá te descobrir, que você se inscreve nos concursos e
todos os lugares vão te aceitar, até por que o trabalho não deve
nem estar perto de algo maduro. Não tem vivência, coerência,
comparação, experiência e tudo isso faz com que você olhe um
trabalho meu, ou de qualquer artista, com uns dez anos de carreira
hoje, e olhe o trabalho de uns 10 anos atrás, percebe o refinamento
dele. Já tive algo que não é exatamente uma vergonha mas
trabalhando em separado: “isso eu faço mas o que quero mostrar é
isso”. Hoje vejo que foi uma forma de concluir, me manter com arte,
não necessariamente com o que queria mas coisas que me davam muito
prazer. É muito gostoso entrar num atelie e trabalhar com crianças.
Desenvolver uma ilustração para um livro. Agradeço muito ao
curso, não por ter aprendido todas as técnicas, por exemplo a fazer
uma ilustração mas conhecimentos básicos sobre composição,
cores, a própria História da Arte. Se souber usar depois que sair,
saber onde encaixar, encontra muito mais por que apesar de sair daqui
sem uma profissão sai com uma formação. Era o que eu procurava.
Agora
como artista contemporanea aqui em MS, já expus minhas obras em
vário lugares. E não é fácil: sair com portfólio na mão e enfim
a gente acostuma. Aqui tem um nicho pequeno, são poucos lugares para
expor, de espaço que pode ser conquistado então agora, de uns cinco
anos pra cá, considero que tenho amadurecimento para ir para fora.
Não por que aqui não seja bom mas para conquistar um espaço maior.
Entrar em lugares desconhecidos.
Uma
artista contemporânea que utiliza a pintura...
Eu tenho
só um trabalho que não é bidimensional: uma instalação que fiz
no MARCO que também que utiliza a parede mas não é pintura e todo
o resto do meu trablho é desenho ou é pintura. Vejo como
extremamente pós-moderno trabalhar com desenho ou pintura. Hoje. É
uma possibilidade. Essa total novidade dos meios, bem tipica da
década de 60, faz parte de um encantamento, de uma empolgação,
como se todo o resto fosse ultrapassado, que é bem datada. Já
surgiu tantos meios. Tantas formas de arte. Desde uma xerox
à projeção em 4D. Percebo que, mesmo dentro desses meios, os
fundamentos: o que será feito, a questão da poética, o conceito,
se tem potencial para ser belo, para ser grotesco, tudo isso faz
parte da coisa. Tem de ser pensado. Fazer uma pintura, um trabalho
hiper tecnológico ou com o corpo. Não vejo muitos limites. A
pintura e o desenho são as técnicas que me saio melhor. Gosto muito
do fazer. A produção que inclui o artesanal. Me vejo tão
contemporânea quanto um Tubarão Dulixo.
Portfólio
de baixo do braço. O que é um portfólio? Por onde começar?
O
portfólio é a apresentação inicial do artista que, sem ele, não
vai pra nenhum outro lugar. Qualquer lugar que você vai como artista
a primeira coisa que você deve levar é o portfólio para quem
quiser ver seu trabalho ou conhecer seu atelie e reconhecer seu
trabalho fisicamente. Ele é essencial para tudo. E não existe um só
portfólio. O ideal é pensar em um para cada situação.O básico é
com as principais séries e obras pra quando perguntarem o que você
faz. Hoje a maioria dos artistas tem um portfólio virtual que fica
muito mais simples você andar com um cartão por que todo mundo tem
acesso a internet. Praticamente todo mundo mesmo. Muito melhor que
andar por ai com pasta debaixo do braço e ninguém mais faz isso. É
fundamental para um artista ter um portfólio que ele possa
apresentar virtualmente. Quanto mais simples melhor. Mais
selecionado, não põe tudo o que tem. Coloque o que realmente
representa seu trabalho neste portfólio básico. Fora isso, tudo que
desejar ingressar precisa de um portfólio que geralmente é mais
especifico. Edital para salão já traz todas as informações sobre
categoria, página, tamanho então é bem didático de fazer. Tem
portfólio que faz para expor em algum lugar. Um trabalho novo que
queira mostrar. Para cada caso é um. O fundameltal é que esse
portfólio traduza o melhor possivel seu trabalho. O que for preciso:
uma ótima fotografia, video, o que for com a melhor qualidade
possível. É um investimento que você faz: se não sabe fotografar
pede a alguém que saiba, pode ser um amigo, levar para imprimir em
um bom lugar, tratar as fotos. Isso é fundamental. Também em
relação ao portfólio quanto menos elementos conter considero um
portfólio mais eficiente. Ele não é uma obra de arte. É uma
apresentação de obras de arte então quanto “mais branco e arial
melhor”. Letra tamanho 12. Tudo para o seu trabalho aparecer.
Formada
em 99 e agora professora do curso. Como você analisa a produção do
curso e as diferenças entre licenciatura e bacharel?
Primeiro
que entre a licenciatura e bacharelado existe uma diferenciação bem
clara: quem faz licenciatura entra num curso que forma professores em
artes. Se talvez ele desenvolva, o que acontece muito, e queira
assumir outra coisa dentro da arte como artista mesmo ou produtor
cultural, artesanal é algo que acontece depois. A intenção de
quem entra no curso é para ser professor. Creio que a grande
maioria acaba sendo professor, uma escolha que acho bem bacana e,
dentro do contexto atual, bem inteligente por que se gostar disso e
tiver uma passagem legal por aqui muito dificilmente ficará
desempregado nos próximos dez anos.Ter todas as condições para
exercer a profissão. Agora o bacharel não. Ele entra no curso de
artes para ter uma formação em artes, para possibilitar que ele
siga uma carreira artistica ou continuar estudo academico em
instituições, ir para o design, o
curso tambpem dá uma formação básica para isso. São cursos bem
distintos. Pode até entrar um na carreira do outro mas são
separados. Há até uma “briga”, nossa, interna para que o curso
tenha duas coordenações por que nós temos dois cursos funcionando
e cada vez mais a tendencia é saparar mesmo.
E
a produção dos alunos o que acontece muito é que quando sai daqui
até quem tem uma pretensão de seguir uma carreira artistica acaba
desistindo disso no primeiro ou no segundo ano de formado. Voltando
aquele historia: qualquer carreira de profissional liberal, que é o
caso de um artista, o começo é sem base, sem pé mesmo. Para
continuar na carreira tem que ter uma forma manter-se e, de
preferencia, continuar trabalhando com a arte. E preserverar. A não
ser que você tenha muita sorte ou seja muito bom, é um processo
longo. Acontece isso: muita gente sai daqui e tem um trabalho de
conclusão interessante, consegue fazer uma exposição ou outra e
nunca mais trabalha com aquilo. Trabalha com algo ligado a arte mas
como artista acaba desistindo e temos uma quantidade de artistas,
colocando-se como tal por mais de 5 anos que é um tempo para falar
de uma carreira, pequena. Como qualquer outra carreira. Odonto,
exemplo, de 40 formandos todos vão ser dentistas. Agora um dentista
com destaque que continuou estudando, tem uma técnica diferente, é
alguém importante dentro da odontologia vai ser um que sai por
turma. É complicado exigir que cada turma do bacharelado forme 30
artistas. Não acontecerá. Ao mesmo tempo que gostaria que fossem
mais, também há muitos que no decorrer do curso descobrem que area
deles é outra. E o curso tenta melhorar esta orientação
profissional através de uma disciplina, acontece muito esta
desilusão. Sair daqui com o TCC, com aquele monte de tela, não tem
nem onde guardar isso, começa a dar para os amigos, etc. Falta um
pouco dessa visão mais realista da carreira de artista que não é
só no MS. Se for para São Paulo pode até ter mais campo e
consequentemente mais concorrência. Não será simples em lugar
nenhum, nem nunca foi e nem será agora. Também há falta de um
pouquinho de confiança e crença pessoal. Perseverar se for isso que
quer. A gente tem em 30 anos de curso uns 15 artistas que sairam
daqui. Dá para melhorar esse número. Ainda é baixo.
No
Festival de Arte e Tecnológia houve uma discussão sobre a produção
contemporânea aqui no estado. Existe uma produção contemporânea
em Mato Grosso do Sul?
Depende.
De um forma geral engloba muita gente desde artesanato que é vendido
na casa do artesão até os trabalhos que se colocam como arte
contemporanea. O que é complicado naquela discussão não foi a
opinião do acadêmico do IESF sobre os trabalhos. Via-se claramente
que eram trabalhos que apoiavam ele. O que me preocupa é um
professor simplesmente colocar que depois da década de 60 nada foi
feito. Concordo com ele no ponto em que a gente tem uma dificuldade
muito grande de continuidade na carreira fazendo que o próprio
artista tenha um desenvolvimento muito curto o que não o sustenta
para ser colocado dentro de um circuito de arte. Isso é verdade
mesmo. Agora dizer que não existe é muito temerário. Já sentei
com vários amigos que não são do meio das artes, entre eles um
casal de amigos que vieram de São Paulo, e o cara tinha conhecido em
dois dias mais museus do que os outros que vivem aqui a vida inteira.
E não é por que eles não tem acesso, não tem como irem para lá.
Isso não é desculpa para eles e nem para ninguém por que todos os
espaços são gratuitos. É uma questão cultural. Agora se um
professor de artes chegar numa sala de aula e falar que não tem nada
para ver, e o pai não leva por que também escutou que aqui não faz
nada. É claro que o aluno não verá. E não acho que meus amigos
não foram por que eles desprezam arte é por que acham que não tem
nada para ver. Não se pode ser um professor de artes e falar uma
coisa dessas. Uma coisa é incentivar os alunos a terem um olhar
crítico sobre uma produção de MS comparando com produções de
fora, outra é ignorar o esforço e o trabalho de pessoas que podem
não fazer o que eles querem. Então existe uma produção, só que
não é continua. Acho que esse é o maior problema. Tenho percebido
que não é só uma coisa que aocntece aqui mas, não sei como está
lá fora, nacionalmente pessoas que aparecem, fazem exposição, leio
sobre em revistas e depois nunca mais ouço falar do artista. Sinto
muito essa falta de continuidade. E ainda até uma falta de dialogo
com o público. A escolha de caminhos mais fáceis, mais palatáveis,
mais digeriveis e não uma coisa da arte contemporânea que flerta
muito com o conceitual, poéticas que convidam mais a pensar então
realmente tem pouca produção assim. Dizer que não tem ninguém,
que ninguém faz nada é uma ofensa.
Exposições
atuais e seleções.
Uma
coletiva no Otacvio Guizzo com 4 obras de uma série em que trabalho
fábulas utilizando o desenho, na mostra Dialetos que rodou o
Centro-Oeste e dia 30 começa o Salão de Artes de MS 2012.
Em
que foi premiada...
Fui.
Isto é muito legal de falar por que ao mesmo tempo que o prêmio é
um incentivo, quando tentamos essa parte de salões. É um lugar bem
bacana para expor por que a partir do momento que seu trabalho foi
pro salão siginifica que já passou por um processo de seleção e
que está mais maduro. Eu aprendi com o tempo que não pode pensar no
prêmio para não se decepcionar. São poucos prêmios para muitos
artistas. É para ser comemorado mas nunca procure entrar no salão
por causa do prêmio. Não dá certo. É muita gente. Muito aluno
daqui diz que não se inscreverá em outro salão por que não o
aprovaram. E dai? Veja como está seu trabalho, que salão que era
esse, se tinha haver com ele, se não há outro lugares para colocar,
etc. O salão tem isso se você entrar te faz muito feliz.
Ter muito forte na cabeça: que são três pessoas que
analisaram 700 portfólios, são pensamentos diferentes e levar pro
lado pessoal nunca mais se increve.
E
como se sente entrando num salão com pessoas mais novas, mais velhas
e principalmente com ex-alunos como Zé Yura?
Me
sinto super orgulhosa. Especialmente do Zé por que trabalhei com ele
bem de perto para o TCC e ele é um exemplo disso que falei. A não
ser que ele mude muito de ideia, é um cara que não vai desistir tão
cedo. Tem uma vontade muito grande, de produzir, de ser um artista,
produzir em arte, são várias ideias. Tem muita coisa para aprender
mas já está num nivel muito diferente de muitos que saem daqui. Em
termos de poética consolidada. Já havia entrado no salão antes.O
Zé já vejo como meu colega assim como o Evandro Prado que também
foi meu aluno. Vejo sem nenhuma hierarquia nenhum dos dois. Quanto
aos artistas mais velhos, mais novos. Não sei. Neste ponto nem gosto
muiuto de fazer essa ocmparação. Conheço artistas, todo mundo
conhece, Paul Cezanne que aos 70 anos teve sua maior produção. Todo
mundo concorda, no meio artistico. As obras mais importantes são
depois dos 50 anos. E há outros artistas que estouraram enquanto
eram jovens e aquilo foi o auge do trabalho deles, depois foram se
repetindo. O Picasso, se colocar o trabalho dele da fase cubista que
foi aos trinta e poucos anos. Colocar em termos de produção
artistica a idade é de acordo com a pessoa, o que faz naquele
momento. Às vezes a idade ajuda por que depura o trabalho ou
prejudica por que perdeu o folego. Isso é característico a cada
personalidade. Espero que meu trabalho melhore e não perca
o folego.
O Salão de Artes de Mato Grosso do Sul tem abertura hoje, dia 30 de outubro, às 19:30
Brincadeiras a parte, agradecemos toda a paciência, apoio e abertura que desde dos primeiros dias do blog a Priscilla nos deu. Muito Obrigado e parabéns plos prêmios! ;)
Thiago Moraes
NAJON
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